sexta-feira, 5 de abril de 2013

04/04/2013

Contraf-CUT critica projeto dos bancos para regulamentar sistema financeiro

Depois de seis anos tramitando no Senado, o projeto de lei complementar substitutivo do senador Francisco Dornelles (PP-RJ) que regulamenta o Sistema Financeiro Nacional (SFN), e dentre outras coisas concede "autonomia operacional" ao Banco Central, recebeu parecer favorável e vai entrar na pauta de votação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), segundo informou o jornal Valor Econômico na edição de quarta-feira (3).

"Esse é o projeto dos bancos. O parecer favorável faz parte da gigantesca ofensiva em curso promovida pelo mercado financeiro, com forte repercussão na mídia, para pressionar o governo federal a abandonar a política desenvolvimentista e a assumir a agenda neoliberal que, a pretexto de combater a inflação, propõe o aumento dos juros, contenção do consumo e do crédito e demissões de trabalhadores", avalia Carlos Cordeiro, presidente da Contraf-CUT.


"Esse projeto visa blindar o Banco Central, torná-lo ainda mais independente do governo, aniquilando a transparência. O BC ficaria assim sob controle absoluto dos banqueiros", critica Carlos Cordeiro. "Nós queremos o oposto disso, que é tornar o BC independente do mercado financeiro, transparente e sob controle da sociedade."


Por uma conferência nacional do sistema financeiro


Para o presidente da Contraf-CUT, a ofensiva do mercado financeiro no Congresso e contra a política desenvolvimentista da presidenta Dilma Roussef torna ainda mais urgente a convocação de uma Conferência Nacional do Sistema Financeiro, antiga reivindicação dos bancários e da CUT.


"Os bancos estão claramente chantageando o governo e a população com a campanha maciça por aumento dos juros para conter a ameaça inflacionária. A sociedade brasileira precisa reagir e entrar nesse debate para escolher que tipo de sistema financeiro ela quer para o Brasil. Esse que está aí, que cobra os juros e spreads mais altos do mundo, segura o crédito e marginaliza amplos setores da população, ou um outro que cumpra a função de financiar o desenvolvimento econômico e social do país?", indaga Carlos Cordeiro.


"Por isso, é imprescindível uma Conferência Nacional que discuta o sistema financeiro. A presidenta Dilma já concordou com a defesa dos interesses dos consumidores, incluindo os direitos dos clientes bancários. Consideramos isso muito importante e vamos participar, mas continuamos defendendo um grande debate nacional sobre o papel do sistema financeiro", salienta Cordeiro.


Dois projetos em confronto


O projeto de lei que recebeu parecer favorável na CAE, de autoria do ex-senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), mas bastante modificado pelo relator Dornelles, se aprovado pelo Congresso, regulamentará o Artigo 192 da Constituição e substituirá a Lei 4.595, de dezembro de 1964, que até hoje regula o sistema financeiro.


Ele é frontalmente contrário às propostas que vêm sendo aprovadas pelos bancários em suas conferências nacionais, que visam atualizar o projeto apresentado ao Congresso Nacional na década de 1990 pela então CNB-CUT, antecessora da Contraf-CUT.


O projeto de Dornelles propõe mandatos de seis anos (escalonados) do presidente e dos diretores do Banco Central, que podem ser reconduzidos uma única vez. A demissão do presidente ou dos diretores do BC, pelo presidente da República, terá que ser devidamente justificada e previamente aprovada pelo Senado, em votação secreta.


A demissão dos diretores do BC só poderá ocorrer, segundo o projeto de Dornelles, se houver descumprimento de metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) ou por gestão que cause grave prejuízo à economia nacional. O presidente do BC ou os diretores também poderão ser substituídos em caso de renúncia, aposentadoria compulsória ou condenação judicial transitada em julgado.


Os objetivos principais do BC serão, de acordo com o projeto, "a estabilidade de preços e a solidez do sistema financeiro". Está prevista a criação de uma taxa de fiscalização que será recolhida, semestralmente, ao BC pelas instituições sob sua supervisão. Essa taxa será regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O BC será responsável pela execução das políticas monetária e cambial definidas pelo CMN e terá autonomia para escolher os instrumentos de execução dessas políticas.


Cheque em branco


"Avaliamos que definir um mandato de seis anos para os diretores do BC, não coincidindo com o mandato do presidente da República e sem estabelecer atribuições e responsabilidades, é passar um cheque em branco para as instituições financeiras. Hoje, o BC já vem atuando como um sindicato dos bancos, baixando resoluções que somente atendem aos interesses dos banqueiros, como a substituição de agências e postos de serviços por correspondentes bancários, precarizando o atendimento da população", aponta Cordeiro.


"Mais importante", para o presidente da Contraf-CUT, "seria regulamentar o artigo 192 da Constituição, após a Conferência Nacional do Sistema Financeiro, bem como estabelecer que o Banco Central, além das metas de inflação, passe a definir também metas sociais, como o aumento do emprego e da renda dos trabalhadores e a redução das desigualdades sociais do país, impulsionado o desenvolvimento do Brasil", conclui o dirigente sindical.


Propostas dos bancários


As propostas dos bancários para regulamentação do Artigo 192 da Constituição defendem um SFN voltado para o desenvolvimento econômico e social do país, democrático e sob o controle da sociedade. Querem, entre outras coisas:


- Ampliação do Conselho Monetário Nacional (CNM), permitindo a participação fiscalizadora da sociedade.


- Democratização e controle social do sistema financeiro.


- Definir mecanismos de política econômica que o BC disporá para cumprir sua missão de controle da inflação.


- Direcionamento de crédito e regulação dos juros para áreas prioritárias.


- Discutir volumes, custos e setores a serem atingidos por operações de crédito obrigatórias.


- Normatizar a atuação dos bancos públicos e privados e orientar a sua atuação para o desenvolvimento econômico e social do país


- Regular as atividades dos bancos estrangeiros para sejam subordinados aos objetivos nacionais.


- Assegurar regras para a supervisão bancária.


- Estabelecer metas sociais e não apenas controle da inflação.



Fonte: Contraf-CUT com Valor Econômico

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Mandato de seis anos para diretores do BC entra em pauta

Por Ribamar Oliveira | De Brasília
José Cruz/ABr - 13/4/2011 / José Cruz/ABr - 13/4/2011 
 
Dornelles: recondução de diretoria do Banco Central será limitada a uma vez
Depois de seis anos tramitando no Senado, o primeiro projeto de lei complementar que regulamenta a estrutura do Sistema Financeiro Nacional (STN) recebeu, finalmente, parecer favorável e entra agora na pauta de votação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Se aprovado pelo Congresso, o projeto substituirá a Lei 4.595, de dezembro de 1964, que até hoje regula o funcionamento do sistema financeiro. O relator do projeto é o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que apresentou um substitutivo.
Dornelles propôs, em seu substitutivo, que o presidente e os diretores do Banco Central tenham mandatos de seis anos, podendo ser reconduzidos uma única vez. A demissão do presidente ou dos diretores do BC, pelo presidente da República, terá que ser devidamente justificada e previamente aprovada pelo Senado, em votação secreta.
A demissão só poderá ocorrer se houver descumprimento de metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) ou por gestão conducente a grave prejuízo à economia nacional. O presidente do BC ou os diretores também poderão ser substituídos em caso de renúncia, aposentadoria compulsória ou condenação judicial transitada em julgado.
Os primeiros diretores do BC a serem empossados após a entrada em vigor da lei terão mandatos de um a seis anos, escalonados, de acordo com o projeto. "Assim, haverá constante renovação da diretoria colegiada [do BC] e os mandatos não coincidirão com o do presidente da República, garantindo o objetivo de autonomia operacional da instituição", escreveu o senador do Rio de Janeiro em seu parecer.
Os objetivos principais do Banco Central serão, de acordo com o projeto, a estabilidade de preços e a solidez do sistema financeiro. Está prevista a criação de uma taxa de fiscalização que será recolhida, semestralmente, ao BC pelas instituições sob sua supervisão. Essa taxa será regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O BC será responsável pela execução das políticas monetária e cambial definidas pelo CMN e terá autonomia para escolher os instrumentos de execução dessas políticas.
De acordo com o projeto, caberá ao Conselho Monetário, além de estabelecer as metas das políticas monetária e cambial, regulamentar o controle do risco sistêmico sobre todo o sistema financeiro nacional, que abrange, além dos mercados financeiro e de capitais, os mercados de seguros, capitalização e previdência complementar.
Dornelles diz, em seu parecer, que uma das lições da atual crise financeira internacional é que a supervisão dos sistemas financeiros deve ser feita de forma a considerar os riscos gerados em todos os mercados, ou seja, deve considerar as possibilidades de difusão de risco de um mercado para outro. "A experiência demonstrou que a segregação regulatória entre mercados não é a melhor forma de gerir riscos quando há grande interdependência entre eles", explicou. "É necessário, assim, que haja uma centralização na tarefa de controle do risco no sistema financeiro na sua conceituação mais ampla, que vai além dos limites do mercado financeiro". A proposta prevê que caberá ao BC o monitoramento, a prevenção e o controle do risco sistêmico.
Uma instituição financeira passa a ser a pessoa jurídica cuja atividade principal seja o empréstimo remunerado de recursos monetários captados de terceiros, de acordo com o projeto. Foram classificadas também como instituição financeira as empresas atuantes no mercado de cartões de crédito e de débito, por terem papel relevante tanto na concessão de crédito quanto no sistema de pagamentos. As empresas que atuam na captação de poupança popular, mas que não se enquadram estritamente na definição de instituição financeira, como administradora de consórcio, por exemplo, terão organização e funcionamento regulamentados pelo CMN.
O projeto é de autoria do ex-senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), mas foi bastante modificado por Dornelles, que preferiu um texto mais conciso. O projeto original previa, por exemplo, que o Conselho Monetário Nacional teria participação dos presidentes da comissões econômicas da Câmara e do Senado, sem direito a voto. Isto foi suprimido.
Questionado ontem pelo senador Dornelles sobre o projeto que regulamenta o sistema financeiro, durante audiência pública na CAE, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, disse que está à disposição para contribuir no debate "trazendo um pouco da experiência internacional".

terça-feira, 2 de abril de 2013

Amar os bancos

Por Luiz Gonzaga Belluzzo
Daniel Acker/Bloomberg 
 
Amar os bancos
"Amar os bancos, odiar os banqueiros" é o título do artigo do economista Raghuram Rajan publicado ontem no Valor. Rajan inscreveu seu nome entre os poucos que soaram com antecedência os alarmes da crise. Em 2005, ele apresentou em uma conferência em Jackson Hole o texto "Has Financial Development Made the World Riskier?". Foi açoitado por invectivas e desqualificações, isto é, pelos métodos mais utilizados nos debates contemporâneos, cuide-se de temas econômicos, esportivos, sociais ou políticos. Entre os críticos mais ferozes de suas advertências figurava o expoente dos saberes econômicos Lawrence Summers.
No artigo de ontem, Rajan trata das posições radicalizadas que se digladiam em torno da regulamentação das atividades dos bancos: 1) os críticos recomendam uma forte redução da alavancagem, especialmente no tocante à sustentação de ativos com empréstimos de curto prazo; 2) os banqueiros argumentam que ampliações adicionais na capitalização elevariam as taxas de juro e assim afetariam negativamente a atividade econômica.
A estabilidade da economia monetária depende das complexas relações entre os fundos coletivos administrados pelos comitês privados de avaliação do crédito e da riqueza mobiliária e a capacidade do Estado, mediante as decisões do Banco Central, de orientar as expectativas dos agentes privados empenhados na liça da acumulação de riqueza abstrata. Esses trabalhos do Estado são executados pela política monetária do Banco Central em conjunto com a gestão da dívida pública pelo Tesouro.
Os grandes conglomerados financeiros buscaram escapar das regras prudenciais
No regime de moeda denominada pelo Estado e emitida pelo sistema bancário, a estabilidade da economia não pode ser garantida, como imaginam os partidários da desregulamentação máxima pelos critérios privados, como o demonstra à saciedade a experiência histórica dos sistemas bancários desregulamentados e, na prática, desprovidos de autoridade central pública. A crise de 2007 desvelou as relações carnais entre o dinheiro, as finanças públicas e os mercados financeiros privados no capitalismo contemporâneo.
O moderno sistema de crédito - aí incluído o Banco Central - opera como o espaço em que se explicita a natureza ambígua do dinheiro na economia capitalista: bem público, ou seja, forma social da riqueza e objeto do enriquecimento privado. Os bancos (e, hoje, os demais intermediários financeiros que se abastecem nos mercados monetários) são provedores da infraestrutura do mercado, na medida em que definem as normas de acesso à liquidez, ao crédito e administram o sistema de pagamentos. Tais normas impõem constrangimentos às condições de produção e de concorrência das empresas. Gestores público-privados da forma geral da riqueza, os bancos cuidam de administrar o estado da liquidez e do crédito de acordo com a maior ou menor confiança na possibilidade das empresas e dos governos de controlarem seus balanços.
A propriedade, agora socializada pelo controle do capital líquido (pelos bancos e pela massa de poupadores), reclama a presença de um ente público capaz de garantir, em última instância, as condições monetárias adequadas à reprodução do capital. O Banco Central assume a função de coordenador das expectativas privadas que governam as decisões sobre a posse da riqueza.
O sistema bancário deve assumir as funções e administrar simultaneamente os dois riscos inerentes à economia monetária, o de liquidez e o de pagamento. O sistema bancário, incluído o Banco Central, deve respeitar as regras "convencionadas" que o obrigam a funcionar como redutor de riscos e de incerteza e como gestor dos limites impostos aos produtores e detentores privados de riqueza, enquanto candidatos a acumular riqueza universal.
Por isso, num regime de moeda fiduciária, a prerrogativa de criação de moeda pelos bancos privados está subordinada às regras de capitalização impostas pelas autoridades reguladoras. As exigências de garantias para a "criação" das moedas bancárias de emissão "privada" (mas de aceitação geral) revela o duplo caráter dos bancos na economia capitalista: 1) empresas privadas que visam maximizar a rentabilidade de seu capital num ambiente de concorrência; e 2) instituições responsáveis pela gestão da moeda e do sistema de pagamentos.
Nos anos 2000, no rastro da desregulamentação, a dívida intrafinanceira como proporção do PIB americano cresceu mais rapidamente do que o endividamento das famílias e das empresas. A "endogeinização" da criação monetária mediante a expansão do crédito chegou à perfeição em suas relações com o crescimento do estoque de quase-moedas abrigado nos "money markets" funds. Esses fenômenos correspondem ao "controle privado da riqueza social", fenômeno que se realiza no movimento de expansão do sistema capitalista.
Eliminada a separação de funções entre os bancos comerciais, de investimento, seguradoras e associações encarregadas dos empréstimos hipotecários, os grandes conglomerados financeiros buscaram escapar das regras prudenciais, promovendo o processo de originar e distribuir, impulsionando a securitização dos créditos e a alavancagem das posições financiada nos mercados monetários.
Luiz Gonzaga Belluzzo - ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda é professor titular do Instituto de Economia da Unicamp e escreve mensalmente às terças-feiras. Em 2001, foi incluído entre os 100 maiores economistas heterodoxos do século XX no Biographical Dictionary of Dissenting Economists.